sábado, 15 de janeiro de 2011

eu sou de Friburgo

“No man is na island, entire of itself; every man is a piece of the continent, a part of the main. If a clod be washed away by the sea, Europe is the less, as well as if promontory were, as well as if a manor of thy friend’s or of thine own were. Any man’s death diminishes me, because I am involved in mankind; and therefore never send to know for whom the bell tolls; it tolls for thee”.

John Donne, poeta inglês do século XVI, em seu famoso texto “Meditações XVII”, escreveu esse belíssimo trecho, mais tarde usado pelo escritor norte-americano Ernest Hemingway em seu romance “Por quem os sinos dobram”, citação esta transcrita aqui em inglês, abaixo traduzida, que sempre me encantou, e que mais tarde virou filme com Ingrid Bergman e Gary Cooper:

“Nenhum homem é uma ilha, sozinho em si mesmo;
cada homem é parte do continente, parte do todo;
se um seixo for levado pelo mar, a Europa fica menor,
como se fosse um promontório,
assim como se fosse uma parte de seus amigos ou mesmo sua;
a morte de qualquer homem me diminui,
porque eu sou parte da humanidade;
e por isso,
nunca procure saber por quem os sinos dobram,
eles dobram por ti”.

A razão de meu encanto pela citação acima não é apenas sua beleza poética, é seu sentido mais profundo: John Donne já sugeria que nenhum homem poderia existir sozinho. Ele afirma que nós somos todos interligados, e que a perda de um ser humano é também a nossa perda. Nesse mesmo sentido, a morte de uma pessoa é a nossa própria morte, ou seja, cada vez que os sinos dobram, a humanidade perde algo precioso: uma vida, e, com ela, toda uma história. O som dos sinos é um lembrete de nossa própria mortalidade, de nossa própria fragilidade.


tenho ficado todos os meus momentos possíveis acompanhando as notícias da minha tão machucada cidade.  Moro em Niterói desde meus cinco anos de idade, mas a proximidade  geográfica é tanta, que vou pra serra pelo menos uma vez por mês, praticamente, desde que saí de lá.
É lá que está a minha origem, minha avó materna alugava sempre um apartamento para as férias, meus pais se conheceram num baile de Carnaval no clube Xadrez, ao lado da Praça do Suspiro, onde ficava o teleférico que sumiu.
O apartamento onde eu nasci é perto de onde desceu a encosta na rua que soterrou o carro com os bravos resgatistas soldados bombeiros.
Qualquer criança que estude Geografia e História do Brasil vai ler sobre Petrópolis e Teresópolis, pq nossa pequena Realeza lá fincou marcos importantes, mas tenho consciência que Nova Friburgo não tem essa relevância, pelo menos não até agora...
É um município pequeno, com um  perfil rural predominante de importante produtor de hortifrutigrangeiros para o centro metropolitano do Grande Rio, humilde e simples, de terceira e quarta gerações de imigrantes, como eu.  Há pouco tempo que o ensino de nível superior chegou lá,  tem um pólo de confecção de lingerie que adoro, mas é uma cidade modesta.
Assim que a condição de vida permitiu, meu pai adquiriu um imóvel em sua cidade, pra voltar vitorioso na vida, de onde ele saiu sem ter nada de seu...
Moramos em frente ao rio Bengala, e já não é a primeira enchente que vemos.  Mas a impressão que tenho, é que não existia nada que pudesse ter sido feito pra impedir essa calamidade.  Não se negocia com a natureza nessas proporções, ainda não temos esse poder.  A zona crítica foi aqui, mas está sendo transmitido pelos meios de comunicação chuvas impactantes desde o norte do Estado de São Paulo, ao sul de Minas Gerais e Espírito Santo.  A própria Natureza está em revolução... somando-se as intervenções desastradas, desmedidas, predatórias e ignorantes do homem.
Inúmeras imagens transmitidas pela TV, me transportam pra minha história e para o local.   A casa da minha Dinda, cheia de pés de jabuticaba (e onde eu estive quinze dias atrás), a Igrejinha onde eu fui batizada, o colégio que minha mãe dava aula, a pracinha que eu passeava de charrete puxada por bodes...
A TV não passa um décimo da percepção da realidade, não passa o cheiro do ar molhado, a textura de se andar derrapando inseguramente na lama, o barulho dos motores dos carros numa confusão constante, a atmosfera de atordoamento achapante, a angústia e o torpor de tão extrema experiência, a perplexidade da multidão que chega aos locais de informação e centralização dos serviços,  nossa vã crença em recusar ao aceitar nossa impotência perante o imponderável da Vida que não podemos conter, a alegria de se conseguir uma simples refeição quente, de se abrir uma torneira e ter água corrente, um banho quentinho, a humanidade de um sorriso, de um olhar amigo e companheiro, luz elétrica.
Exatamente como num filme hollywodiano calamitoso e catastrófico, o ser humano se prova nessas horas, para o melhor e para o pior.